O AVE, ou Acidente Vascular Encefálico, é um problema cada vez mais freqüente na população. É um acometimento muito comum na população idosa e muito associado com a incidência de hipertensão arterial sistêmica.
As consequências do AVE são individuais e comunitárias, por ele ser um evento com alta morbidade e mortalidade e por impactar diretamente na funcionalidade do indivíduo, na sua participação, trabalho e círculo social.
O fisioterapeuta é o profissional diretamente responsável por grande parte do cuidado dos pacientes com sequelas de AVE, que apresentam diferentes manifestações.
Como sabemos, o AVE pode ser isquêmico ou hemorrágico, sendo que o tipo mais comum é o isquêmico.
Muito comumente, o AVE afeta o território da artéria cerebral média (ACM), levando à problemas relacionados com as áreas irrigadas por essa artéria, principalmente nas vias sensitivas e motoras, tanto aferentes quanto aferentes, do sistema nervoso central.
Principais sintomas do AVE
A apresentação mais característica do AVE é na forma de hemiplegia ou hemiparesia do dimídio corporal oposto à localização da lesão cerebral.
A hemiplegia ou hemiparesia leva a uma série de alterações, dentre elas:
- Redução da motricidade e da força em um lado do corpo;
- Parestesia ou alterações de sensibilidade no lado acometido;
- Dificuldade de mobilidade, transferências, equilíbrio e marcha;
- Paralisia facial central;
- Alterações cognitivas tais como apraxia, agnosia e afasia.
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O AVE pode ser diferenciado em duas fases:
- A fase aguda, inicial, flácida ou hipotônica;
- A fase crônica, espástica, posterior ou hipertônica.
A fase flácida é caracterizada pela hipotonia generalizada, ausência total de movimento e de força, no caso da hemiplegia, ou redução dos mesmos, nos casos de hemiparesia, bem como pela hiporreflexia.
Já a fase espástica, é caracterizada pela hipertonia elástica, por hiperreflexia, presença de clônus e sinal de Babinsk, e uma ativação muscular mais intensa, mesmo que descoordenada.
Pensando em longo prazo, as alterações e sequelas do AVE são diversas e se resumem em sete pontos principais:
- Espasticidade
- Redução ou perda completa da mobilidade funcional
- Alterações posturais
- Complicações cardio-respiratórias
- Complicações ósteomioarticulares, como encurtamentos, contraturas, retrações, aderências, e deformidades
- Disfunções biomecânicas nos MMII, em quadril, joelho, tornozelo e pés
- Disfunções biomecânicas nos MMSS, sendo as mais comuns e características delas, a subluxação da articulação do ombro, ombro doloroso ou congelado e síndrome ombro-mão.
Vamos falar agora em detalhes, sobre essas últimas alterações e apresentar o seu tratamento fisioterápico.
Subluxação de Ombro
Essa condição também é conhecida como ombro subluxado ou desalinhamento do ombro.
Normalmente, não é uma condição dolorosa, mas é um acometimento que deixa a articulação do ombro extremamente vulnerável a lesões e com significativa redução de funcionalidade.
Acredita-se que a causa da subluxação de ombro pós AVE, seja uma combinação da hipotonia inicial e da perda da ativação da musculatura estabilizadora do ombro.
Além disso, a postura flexora do braço, favorece mecanismos que reforçam a posição do ombro.
Em condições normais, o braço em posição de adução tensiona a porção superior da escápula e o ligamento coracoacromial, impedindo passivamente o movimento lateral da cabeça do úmero e o seu desvio para baixo.
Para completar, o supra espinhoso reforça a tensão horizontal da cápsula, quando o braço está sob tensão. Esses mecanismos, responsáveis pela estabilização do ombro, estão ausentes no paciente após um AVE.
O ombro subluxado pode se tornar doloroso quando existe um processo de lesão do plexo braquial, principalmente pela realização de posturas e movimentos inadequados com o braço do paciente.
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Os objetivos do tratamento fisioterápico nessa condição são:
- Promover o retorno da estabilização passiva do ombro, corrigindo o posicionamento escapular;
- Estimular a atividade tônica da musculatura estabilizadora do ombro;
- Manter ou recuperar a amplitude de movimento total do ombro, sem que esta gere dor ou lesão.
Tratamento
Para isso, o treino deve ser focado especialmente na correção postural da escápula, na estimulação tônica da musculatura estabilizadora do ombro e no treino de ADM do ombro, tanto passiva, quanto ativa, quando possível.
Atenção específica deve ser dada à mobilização manual da escápula até a posição realinhada, associada à movimentação de tronco e treino de dissociação de cintura escapular. Importante trabalhar o paciente bilateralmente, objetivando um realinhamento de todo o tronco e não apenas ao lado acometido.
A tipoia não deve ser utilizada para tratamento e/ou prevenção, pois ela estimula o padrão flexor e altera a propriocepção e o esquema de percepção corporal.
Ombro doloroso
O ombro doloroso é uma condição que pode aparecer imediatamente após um AVE, ou pode ser manifestar anos após o evento.
Seu desenvolvimento acontece tanto na fase flácida quanto na fase espástica.
Muitos pacientes com dor no ombro possuem também uma subluxação de ombro associada, mas o ombro doloroso não é necessariamente consequência direta dessa subluxação.
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As principais causas do ombro doloroso incluem:
- A perda do ritmo escápulo-umeral, por uma redução da mobilidade escapular em relação à elevação do úmero. Isso leva à compressão das estruturas localizadas entre o acrômio e a cabeça do úmero, gerando dor.
- A perda de rotação externa do úmero, que permanece constantemente na posição de rotação interna devido à ação espásticas dos rotadores internos. Dessa forma, quando o braço é rodado externamente de forma passiva, existe um encontro do tubérculo maior do úmero com o arco coracoacromial, também gerando dor.
- A perda da capacidade de deslizar a cabeça do úmero para baixo na fossa glenóide, quando existe uma mobilidade normal da escápula. Essa situação é mais rara, mas pode acontecer.
O tratamento é focado, principalmente, na recuperação do ritmo escápulo umeral fisiológico, promovendo uma mobilidade escapular adequada, reduzindo o tônus dos rotadores internos, e reequilibrando a postura e os padrões musculares da cintura escapular de forma que o movimento passivo não gere mais dor nem lesão.
Síndrome Ombro-Mão
A Síndrome Ombro-Mão, também conhecida como Atrofia de Sudeck ou distrofia simpático-reflexa, possui como principal característica um edema repentino da mão, que pode evoluir, na ausência do tratamento adequado, para disfunções permanentes e deformidades importantes da mão.
A primeira fase dessa condição, consiste na apresentação de um edema súbito na extremidade do braço, geralmente em mãos e punho, que limita de forma considerável a amplitude de movimento.
A pele se torna esticada e brilhante, normalmente bem úmida.
Esse edema pode estar acompanhado de hipersensibilidade.
A segunda fase é caracterizada por uma dor intensa que pode ser desencadeada por estímulos inofensivos, como o toque.
A limitação de movimento se torna ainda maior, e o punho permanece em flexão.
Na terceira fase, caso não haja tratamento, a mão pode fixar-se em uma posição clássica de flexão, mesmo após a dor e o edema terem desaparecido, pois as aderências e fibroses formadas durante as duas primeiras fases não podem ser desfeitas.
As causas dessa síndrome estão relacionadas ao ciclo vicioso de dor, redução da amplitude de movimento e comprometimento do sistema nervoso simpático presentes no paciente com AVE, o que leva a formação do edema, que perpetua esse ciclo e dá origem a condição.
Além disso, a drenagem linfática do membro superior depende principalmente dos movimentos de grande amplitude dos membros superiores, mais proeminentemente do ombro, movimentos estes que estão prejudicados pela doença.
A prevenção da Síndrome Ombro-Mão se dá, principalmente, pela prevenção do edema no membro superior.
Uma vez que a síndrome já se estabeleceu, o tratamento é feito com o posicionamento adequado do membro superior, com a movimentação ativa e passiva do membro, especialmente nas regiões de drenagem e em movimentos de grandes amplitudes articulares.
Em associação ao tratamento padrão, podem ser utilizadas técnicas de analgesias como a crioterapia, e o enfaixamento compressivo como coadjuvante na redução do edema e manutenção dos ganhos durante as sessões.
Concluindo, a cintura escapular é extremamente importante no paciente com AVE.
Você costuma dar atenção a ela nos seus pacientes após um evento?
Já teve um paciente com alguma das complicações descritas acima?
Conte pra gente nos comentários!
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