Dor Subacromial – “A Artroscopia de ombro funciona?”
Dor Subacromial – A área da saúde pode as vezes parecer um parque de diversões, cheia de montanhas-russas e brinquedos de aventura.
Isso faz com que os profissionais da saúde, frequentemente, mudem sua abordagem, o que pode fazer com que o paciente se sinta andando em círculos.
O mesmo se aplica para a fisioterapia, é claro.
E isso não é ruim não, pelo contrário.
É bem normal até, com novas pesquisas sendo feitas, novas tecnologias e tratamentos sendo descobertos, principalmente no tratamento de situações tão delicadas como a dor e a incapacidade.
Vamos Falar do ombro
Uma das áreas que vêm sofrendo muitos altos e baixos, e algumas reviravoltas ao longo dos anos, é que diz respeito ao tratamento da dor subacromial.
Sim, nesse texto nós vamos nos focar um pouco no ombro.
Mas as considerações aqui feitas podem ser aplicadas para muitos outros casos, vocês vão ver.
A dor subacromial é uma condição bem desafiadora para o fisioterapeuta, devido ao seu diagnóstico difícil, e tratamento incerto.
Dentre as incertezas envolvidas no tratamento da dor subacromial, destaca-se o papel que a cirurgia possui no alívio da dor e melhora do quadro do paciente, especialmente a artroscopia para descompressão subacromial.
Quais seriam os pacientes elegíveis para essa cirurgia, que envolve a raspagem do acrômio e a remoção da bursa subacromial, e as vezes o ligamento coraco-acromial, tão importante para a estabilização do manguito rotador?
O maior problema é que, muitas vezes, a cirurgia é indicada sem critério, de forma rápida, e muitos pacientes ficam ainda piores após o procedimento.
Apesar disso, em alguns casos de dor subacromial, a cirurgia pode ser um sucesso.
Aí entra a pergunta: Porque isso acontece?
O sucesso da artroscopia de descompressão subacromial está na cirurgia, ou na reabilitação?
Para tentar responder essa e outras questões, um artigo publicado no Lancet, chamado “Can Shoulder Arthroscopy Work (CSAW)”, em tradução livre, “A artroscopia de ombro funciona?”
Esse foi um estudo grande, conduzido com rigor, randomizado e controlado, que comparou três grupos de pacientes com dor subacromial.
O primeiro grupo foi o grupo controle, que não recebeu tratamento e foi apenas acompanhado até seis a 12 meses através do Escore de Ombro de Oxford.
O segundo e o terceiro grupos foram submetidos a artroscopia de ombro, tendo sido feita apenas a artroscopia diagnóstica em um grupo, e a artroscopia descompressiva no outro grupo.
Todos os pacientes e os envolvidos no tratamento foram cegados, ou seja, não se sabia quais indivíduos haviam sido submetidos à artroscopia, e qual deles haviam sido submetidos ao procedimento completo de descompressão.
O acompanhamento e a avaliação foi a mesma do grupo controle para os dois grupos intervenção.
O mais interessante foi que não existiram diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos cirúrgicos, demonstrando que raspar o acrômio e remover estruturas adjacentes não é necessário para a redução da dor subacromial.
Ou seja, a cirurgia é basicamente um placebo.
Outro ponto importante foi o fato de que ambos os grupos cirúrgicos tiveram resultados significativamente superiores aos do grupo controle.
O que foi diferente, então?
Fisioterapia: o novo padrão ouro?
O que difere o grupo controle dos dois grupos intervenção foi o tratamento fisioterapêutico e a reabilitação pela qual os dois grupos cirúrgicos passaram.
No entanto, não vamos colocar o carro na frente dos bois e assumir de cara que a fisioterapia é o novo padrão ouro para o tratamento de dor subacromial.
Primeiro, porque estatisticamente significativo não significa clinicamente significativo, pois as diferenças encontradas foram pequenas, de fato.
Outro fator que deve ser levado em consideração é o fenômeno chamado de “desmoralização ressentida”, que é quando os indivíduos alocados no grupo controle percebem, após concordarem em fazer parte do estudo, que não receberão o tratamento, fazendo com que eles reportem os sintomas de forma exagerada, interferindo nos resultados.
Analisando de perto os resultados, precisamos nos perguntar: a melhora é apenas o curso natural da dor subacromial, e tanto a cirurgia quanto a fisioterapia pouco interferem no resultado?
A mesma dúvida que surge com a aplicabilidade da cirurgia e os questionamentos sobre os gastos, riscos e o esforço colocados nela valem a pena, podendo ter em relação ao investimento de 12 semanas de fisioterapia tanto temporal, quanto financeiro.
Estamos tratando mais do que deveríamos e complicando demais a dor subacromial?
Devemos olhar para a profissão e para a prática com o mesmo pensamento crítico com o qual se julga outras.
A fisioterapia é sim efetiva em muitas patologias de ombro, incluindo a dor subacromial.
Isso posto, é sabido que muitos fisioterapeutas complicam demais o tratamento, apelando para alguns recursos mirabolantes e sem eficácia comprovada, fazendo com que ambos, paciente e terapeuta, percam tempo.
Na verdade, a maioria das dores subacromiais podem ser tratadas, simplesmente assegurando ao paciente, de que a dor não é séria e que ela irá melhorar com o tempo, só que irá demorar um pouco mais do que o paciente gostaria, a princípio.
Eles também devem ser aconselhados a seguir com a suas atividades da forma mais normal possível, com a certeza de que não estarão provocando nenhuma lesão adicional, e não limitar nenhuma atividade por causa da dor.
Inclusive, algum tipo de exercício físico pode ser encorajado.
Podemos deixar então uma dica para um futuro estudo. Quem sabe incluir um quarto grupo no estudo mencionado acima?
Esse grupo poderia receber as orientações que acabei de informá-los, juntamente com alguns exercícios gerais de membros superiores.
Quem sabe os resultados não seriam semelhantes, ou mesmo melhores, do que os dos grupos cirúrgicos?
Seria esse o fim da artroscopia de descompressão subacromial?
À primeira vista, o estudo parece marcar o fim da artroscopia para descompressão subacromial…
Mas as coisas não são tão simples assim.
Em alguns casos, a cirurgia pode ser realmente efetiva, desde que bem indicada.
A mensagem principal, que queremos passar hoje é, apesar de sabermos o que sabemos, ainda existe muito a ser descoberto.
E em muitos casos, o tratamento ideal não é tão preto no branco quanto parece em alguns estudos…
O importante é ficar de olho aberto, usar sempre a cabeça, e compartilhar dúvidas e conhecimento na sessão de comentários abaixo!
Veja também – Alavancas no Corpo Humano – Conceitos Para a Fisioterapia