Estimulação Elétrica produz ganho Muscular?

Eletroterapia – Correntes Excitomotoras

Temos hoje, como consenso na literatura, que a estimulação elétrica produz ganho de força muscular, porém menor do que o observado com a contração muscular voluntária.

Em um estudo controlado, foi demonstrado que a estimulação elétrica por um período de três semanas produziu ganhos significativos de força muscular, sendo maior o ganho no grupo tratado com intensidades mais baixas.

A força da contração isométrica demonstrou maiores ganhos que a da contração isotônica concêntrica.

O ganho de força regrediu quando o tratamento foi interrompido após as três semanas, demonstrando a aplicação dos princípios do treinamento físico, como a reversibilidade, para o treinamento muscular com a eletroterapia. Houve também um aumento claro da força isométrica no membro oposto não tratado, um efeito de transferência cruzada que não demonstrou uma diferença, notada apenas entre os grupos de alta e baixa intensidade. (Hon Sun Lai et al., 1988).

Um efeito de transferência cruzada foi também encontrado em um estudo em que o aumento da força foi da ordem 24% nos músculos tratados e um aumento de 10% no músculo não tratado.

Este estudo comparou grupos tratados com três frequências de estimulação diferentes (20, 45 e 80 Hz), e não encontrou diferença nos resultados (Balogun et al., 1983).

O ganho de força muscular demonstrado nesses estudos é atribuído, principalmente, a mecanismos neurais, dentre eles:

  • Ativação aumentada dos neurônios motores que regulam a força da contração devido a estimulação dos neurônios aferentes. Isto explicaria o efeito de transferência cruzada.
  • Sensibilidade sináptica aumentada como um resultado da estimulação contínua das fibras de entrada. O efeito pode durar por algumas semanas.
  • A sincronização dos padrões de disparo das unidades motoras. O recrutamento seletivo das fibras grossas de rápida ativação em detrimento das fibras de disparo lento.

Se os efeitos da eletroterapia para a estimulação muscular e ganho de força são menores do que os efeitos do exercício ativo voluntário, por que, então, utilizá-la?

O valor da eletroestimulação é bem mais claro em músculos enfraquecidos ou enfraquecendo, onde ganhos significativos foram relatados com a melhoria da função muscular.

No estudo feito por Gibson ET AL, em 1988, a estimulação elétrica a 30 Hz aplicada no ao quadríceps de joelhos imobilizados em ciclos de 2s on / 9 off por uma hora por dia, durante seis semanas, demonstrou uma redução da hipotrofia muscular.

Nesse mesmo estudo, a área de secção transversa do quadríceps diminuiu 17% no grupo não tratado, mas hão foi observada perda significativa nos pacientes que foram tratados.

Os objetivos terapêuticos das correntes excitomotoras são, principalmente, aumentar ou recuperar a força muscular e aumentar o desempenho muscular e função física.

O alongamento muscular utilizando corrente elétrica é uma técnica ainda pouco utilizada. Contudo, existe um número considerável de argumentos a favor desta técnica, particularmente se os resultados precisam ser alcançados dentro de um período muito curto de tempo.

 

Entendendo a Estimulação Elétrica Muscular

Para entendermos como a estimulação elétrica atua nas fibras musculares, precisamos primeiramente compreender as características básicas dos dois principais tipos de fibras musculares.

Para relembrar:

  • Fibras tipo I:
    • Fibras musculares vermelhas
    • Filogeneticamente mais velhas
    • Melhor capilarização
    • Frequência  de tetânia de 20 a 30 Hz
    • Inervada pelos neurônios Alfa2
    • Fadiga lenta
  • Fibras tipo II:
    • Fibras musculares brancas
    • Filogeneticamente mais novas
    • Menos capilarização
    • Frequência de tetânia entre 50 e 150 Hz
    • Inervada pelos neurônios Alfa1
    • Fadiga rápida.

Além das características das fibras em si, temos que levar em consideração a inervação das mesmas. Os neurônios motores demonstram propriedades relacionadas às fibras musculares às quais eles inervam.

O neurônio alfa2 é maior que o alfa1. Os neurônios seguem o chamado princípio do tamanho (Henneman), sendo que os menores são ativados primeiro. Uma razão para isto acontecer é que o potencial transmembrana nos neurônios menores é aproximadamente –70mV, enquanto nos maiores é de –90mV.

Traduzindo para nível muscular, temos que as fibras musculares tipo II são ativadas antes das fibras musculares tipo I.

Outro fato considerado no treinamento muscular é que o tecido muscular é capaz de se adaptar à diferentes condições. Em geral, a transformação de fibras musculares tipo I em fibras musculares tipo II ocorre mais facilmente que o caminho inverso. Os limites dentro dos quais essa transformação ocorre, estão relacionados à carga genética individual.

Tendo em mente esses princípios, somos capazes de entender a atuação da eletroterapia em nível muscular.

 

Usos das correntes excitomotoras

A estimulação elétrica é usada para iniciar e facilitar a contração voluntária do músculo. Esta ideia pode ser aplicada em várias circunstâncias:

  • Onde a contração muscular voluntária é inibida por dor ou lesão;
  • Em situações onde a ação muscular não ocorre sob controle voluntário sem pratica – reeducação muscular;
  • Em estados avançados de  lesão nervosa periférica (re-inervação recente);
  • Biofeedback , associado à necessidade de demonstrar ao paciente um movimento ou ação muscular;
  • Em alguns casos de lesões nervosas centrais.

Como dito anteriormente, a estimulação elétrica tem efeito reduzido em relação ao ganho de força muscular, quando comparada à contração muscular voluntária. No entanto, ela terá o mesmo efeito que a contração muscular voluntária no que diz respeito ao aumento temporário no metabolismo muscular.

Os mesmos efeitos associados ao aumento da utilização de oxigênio, da produção de dióxido de carbono, ácido láctico e outros produtos metabólicos, bem como aumento de temperatura e de fluxo sanguíneo local, são observados durante a estimulação elétrica.

Utilizando 10% a 30% da máxima contração voluntária, foi encontrado um aumento de 20% da circulação sanguínea, que ocorreu em torno de 1 minuto após o início da estimulação elétrica e perdurou em torno de 5 minutos após o seu término.

Seria esperado que a estimulação elétrica dos músculos, através do nervo motor, levaria a fadiga muscular relativamente rápido, pois contrações prolongadas demonstram um recrutamento maior de unidades motoras para manter a mesma força muscular levando à fadiga precoce do músculo.

De fato, a fadiga muscular devido à estimulação elétrica é maior que a fadiga devido à contração voluntária isométrica de igual intensidade. O grau e a duração da fadiga estão diretamente relacionados com a duração da estimulação elétrica.

 

Escolha do tipo de corrente

A escolha do tipo de corrente a ser utilizada irá depender de alguns fatores, dentre eles: a resposta em frequência das fibras nervosas que serão estimuladas, a impedância da pele em função da frequência, os efeitos Gildmeister e de inibição de Wedensky e o tipo de modulação da média frequência.

  • Frequência das fibras nervosas:
    • Frequências baixas (cerca de 10 Hz) podem produzir trofismo muscular, porém a estimulação prolongada pode trazer perda de força;
    • Existe aumento do torque à medida que a frequência aumenta, até os 100 Hz;
    • As melhores frequências de estimulação situam-se entre 20 e 100 Hz.
  • Impedância da pele
    • A impedância diminui com o aumento da frequência;
    • Com as correntes de média frequência, os tecidos poderão ser estimulados com níveis muito mais altos de corrente, sem que haja desconforto e risco de efeitos danosos sobre a pele. Isto trará maior efetividade na estimulação, pois mais corrente significa atingir fibras mais profundas, ou seja, trabalhar o músculo todo.
  • Efeito Gildemeister e Inibição de Wedensky
    • A despolarização de fibras nervosas segundo o principio de somação é chamado de efeito Gildemeister;
    • A coincidência de pulsos com o período refratário da fibra nervosa é conhecida como Inibição Wedensky.

 

Indicações

A eletroterapia para treinamento muscular pode ser utilizada nas seguintes situações:

  • Fortalecimento muscular para melhoria do desempenho: melhora da velocidade de disparo do sistema neuromuscular, melhora da força e potência muscular, melhoria da resistência muscular localizada.
  • Fortalecimento muscular em condições patológicas: melhora da estabilidade, reeducação de movimentos e hipotrofias musculares.

 

Cuidados

Como toda técnica empregada em fisioterapia, em alguns casos devemos tomar cuidado com a indicação das correntes excitomotoras, como na presença de lesões musculares ou de tendões, disfunções articulares agudas, espasticidades e miopatias.

O próximo passo na nossa jornada pela eletroterapia será falar da principal corrente excitomotora utilizada na prática fisioterapêutica: o FES. Incluiremos, ainda, o estudo de outras formas de modulação das correntes excitomotoras, para agregar repertório terapêutico e fornecer opções variadas de tratamento, contribuindo para o sucesso da terapia!

Para ler outros artigos da nossa série de eletroterapia, Clique Aqui.

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